O ano era 1959. O jogo
Fluminense x Botafogo no Maracanã. O pai botafoguense o levou para assistir sem
saber que seu filho não seguiria a sua tradição de usar a camisa preto e
branca. Foi justo neste dia em que Sérgio Roberto Azevedo Ribeiro, o Boto, caiu
de amores pela armadura verde, branca e grená.
“Papai sempre foi muito
democrático, inclusive me levava muitas vezes aos jogos, em 1963 vi as duas
decisões”, explica.
E foi do pai que ganhou
sua primeira camisa do Fluminense. “Na época, não tínhamos a facilidade de ter
camisas do clube como hoje. E meu pai me deu muita alegria com o presente”,
conta ele.
Como foi estudar em Campos
em meados de 1965, ele parou de frequentar o templo sagrado do futebol e
retornou com gás total em 1969, quando voltou a morar no Rio.
“Conheci várias pessoas
que, como eu, gostavam de ficar atrás do gol. Com estes amigos formamos uma
torcida dissidente. O GB, Valtinho, João Cysne e eu todos nos unimos para
fundar a Força Flu e logo cuidamos de fazer as camisas”, recorda.
Quando morou no Méier,
todos os domingos eram sagrados os encontros da torcida Força Flu na porta do
Maracanã. A torcida tinha uma salinha atrás do gol e seus componentes chegavam
mais cedo para empacotar talco e arrumar tudo para entrar em campo.
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A primeira formação da Força Flu |
E participar das caravanas
era algo que Boto adorava e carrega muitas lembranças daqueles bons tempos até
hoje. Segundo ele, tudo era muito bem organizado e divertido e as amizades que
fez são para sempre, como uma família. Eles geralmente saiam no sábado a noite
e o ponto de encontro era o edifício da Avenida Central.
“Uma das viagens mais
divertidas que fiz foi organizada pelo Sérgio Aiub, para um jogo contra o
Atlético Mineiro, no Mineirão. Lembro que a situação estava muito ruim para o
clube naquele tempo e ele não conseguiu lotar um ônibus. Com isso, resolvemos
ir num ônibus de carreira. Tínhamos um companheiro o Carlos, que todos
conheciam como boneca, e durante a viagem e no meio daquela brincadeira ele
levantou e disse: “Gente agora vou vestir a minha roupa dormir”. E ele não
entrou no banheiro e saiu vestindo um babydoll.
Era tudo muito engraçado” conta ele.
E ele elogia muito a figura
do querido Sergio Aiub e como sempre tratou a todos com humanidade. “Um cara
sensacional que me lembra um pouco do Chacrinha. E era um animador por
natureza, impossível ficar parado perto dele que estava sempre incentivando o
clube. Outro grande amigo. Também tive o privilégio de conhecer o Bolinha e o
Paulista, grandes pessoas e mais antigos do que o Sérgio. No entanto o Aiub é o
grande ídolo e mestre de todos nós” declara.
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Boto entre os amigos na festa de comemoração dos 45 anos da Força Flu |
Outra passagem divertida
foi num jogo contra o Palmeiras, no Parque Antártica. “Fomos junto com o
Armandão e outros componentes da Young Flu. E antes da partida passamos na casa
de uma família amiga de italianos e junto conosco um tricolor amigo nosso que
usava um com o cabelo bem comprido. Antes da despedida, a senhora muito
simpática perguntou: “Não tem problema vocês irem ao jogo com essa mocinha?”
Resultado, rimos muito e voltamos para o Rio gozando da cara dele”.
E teve o caso do roubo do
Bumbo da torcida e ele e Armando Alcoforado, da Young Flu saíram a procurá-lo
pelo estádio. “Tenho muitas lembranças e passagens dessa época de torcida. E
apesar de ser fundador da Young Flu, o Armando é meu parceirão. Inclusive nos
bares da vida, quando o jogo terminava, era sempre ele, eu e o Valtinho”, diz.
FlaxFlu, Rivelino e promessa pelo título
Para Boto, o Fla x Flu é o
clássico dos clássicos e seu primeiro foi no ano de 1963. “Fluminense empatou
no primeiro turno em 3 x 3 e no finalzinho do campeonato empatamos em 0 x 0 com
o Escurinho chutando na trave. Inclusive o reencontrei três anos atrás, na casa
do Francisco Cysne, e ele já bem idoso não recordava-se de nada” conta.
E quando o assunto tem a
ver com seus ídolos, ele cita Castilho, Valdo, Escurinho, Altair e confessa seu
grande amor por Roberto Rivelino.
“Lembro dos lançamentos
que ele fazia para o ataque e das faltas que batia. Era uma coisa impressionante.
Um atleta que armava todo o ataque do Fluminense. Um cara centralizador e mesmo
assim o que ele distribuía de bolas de um lado e de outro. E as faltas? E os
lançamentos? Ele fazia lançamento para o Gil de 40, 50 metros com uma precisão
que era impressionante. E ele com a bola dominada deixava qualquer defesa
maluca”, fala sobre seu craque favorito.
Boto celebra vários
títulos do Fluminense e me conta que em 1964 foi com seu vizinho assistir um
jogo contra o Bangu que foi seu primeiro título. Em 1969, quando assistiu em
Campos, a semifinal contra o Flamengo, e viu o Fluminense vencer por 3 x 2. Também
não esquece o tricampeonato de 83 / 84 e 85 que foi muito marcante.
“E tem a minha história da
promessa em 1971. Era o jogo da final do Campeonato Carioca: Fluminense x
Botafogo. Eles tinham um time superior ao nosso só que aos poucos começaram a
relaxar e perder para os times pequenos. E no finalzinho da partida o Lula fez
aquele gol. Daí meu pai e a torcida do Botafogo deixaram o estádio e eu fiquei.
Não podia contar sobre a promessa feita ao meu pai. E fui a pé do Maracanã até
o Méier”, diz ele sorrindo.
Ele também sofreu pelo
clube e tem como uma de suas maiores tristezas a morte do zagueiro Ari Ercílio,
em 1972. Ele foi pescar em companhia de sua mulher, Helena, na Gruta da
Imprensa, escorregou numa rocha, caiu no mar e não voltou mais. “Era um bom
sujeito, uma pessoa muito bacana e acessível. Fiquei muito sentido. Ajudamos na
busca e tudo, mas de nada adiantou, foi bem complicado”.
O trio Artime, Gerson e Ari Ercílio |
As mulheres e sua paixão
pelo Flu
Ele foi noivo duas vezes.
A primeira era tricolor e quando ela reclamava e pedia atenção especial ele dizia:
“vamos ao jogo comigo. Acredita que ela se recusou a assistir a estreia do
Rivelino?”.
Sua atual esposa, apesar de
ser flamenguista, convive bem com o amor desmedido do marido. Só teve uma vez em
que a coisa pegou e ela quase deixou o Boto sem entrar em casa.
“Foi uma final contra o
Vasco, onde o Edinho fez o seu, e ganhamos o título. Saímos de Angra dos Reis,
eu e dois amigos, de ônibus e o jogo terminou tarde e perdi o último horário da
condução. Não levei chave, nem nada para evitar perder. Foi complicado para ela
entender o motivo do marido chegar em casa duas horas da manhã. No final nos
entendemos”.
E o que é ser tricolor
para o Boto:
“O Fluminense é tudo para
mim. E sou conhecido em Parati por todos como o Tricolor. As pessoas me param
para conversar sobre futebol e acho isso sensacional. É uma grande alegria essa
interatividade. Vivi momentos inesquecíveis. Muito bom ter essas lembranças do
passado ainda fervilhando em minha mente”.
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